quarta-feira, setembro 08, 2004

"M, Matei"


Um dia paguei uma interrupção voluntária da gravidez. Foi há uns anos. Um amigo chegou ao pé de mim, olhou-me nos olhos e disse: "preciso de dinheiro para ir a Espanha com a minha namorada". Não disse nada. Apenas perguntei: "de quanto é que precisas?"
Neste caso que conheci bem, a questão punha-se assim: o rapaz gostava da rapariga e a rapariga gostava do rapaz. Dormem juntos, e ter um filho é a ultima coisa que querem.Porém ela engravida, e decidem interromper a gravidez. Aqui duas hipóteses: ou há dinheiro e vão ir a Espanha onde sabem que é seguro, ou não há dinheiro e fazem em Portugal numa casa particular. Claro, que entre o haver e não haver dinheiro vai a diferença da vida dela, a possibilidade de nunca mais vir a poder ter filhos, as hemorragias graves, ou correr o isco de vir a ser presa se tiver de ir ao hospital salvar-se de alguma das anteriores. Mas mais: há a culpa e o rótulo de quem "não ama, não mata" e "assassina de bébés".
Neste caso houve dinheiro suficiente e tudo correu pelo melhor, mas para os outros em que não há dinheiro, nunca mais ficarei sem resposta, pois no site da W.o.W está explicado como se pode interromper uma gravidez com a toma de uns comprimidos à venda em Portugal. Então é assim: Compra-se uma embalagem de Cytotec ( cuja substância activa é o Misoprostol) numa farmácia, tomam-se 4 comprimidos e passadas 24 horas outros quatro.

2 comentários:

Anónimo disse...

Leviandade em assuntos sérios dá asneira.
Como seres racionais que somos, temos a obrigação de sermos responsáveis pelos nossos actos e é inadmissível que maiores de idade, com acesso a informação e na maioria dos casos com formação pessoal e académica mais que suficiente para serem mais esclarecidos que um bode montês, tenham atitudes como a que foi descrita.
Nestes casos aplicam-se os adjectivos capricho, irresponsabilidade, cobardia e como já foi dito, leviandade.

A questão dever-se-ia colocar a montante do problema - a consciência e sentido de responsabilidade de cada um na conduta que leva na sua vida - e não a jusante, quando o "problema" existe e tem que ser remediado.
A nossa liberdade acaba quando começa a do outro.
Para todos os efeitos, uma gravidez gera uma vida.
Quem o negar, vá ler compêndios de medicina em vez da Caras.
Uma vez que essa vida ainda não tem meios próprios de defesa, existem leis para o efeito.
Vivemos num estado de direito, suponho...

Nesse caso, mais não temos que ser responsáveis por aquilo que fazemos e assumirmos a responsabilidade.
Não é nenhum crime ter um filho não planeado.
Ninguém vai preso, não ficamos cegos, surdos, paraplégicos, manetas ou pernetas.
Para quem não tem condições materiais ou psicológicas, existem mecanismos que o "welfare state" - que a esquerda tanto defende - deverá incondicionalmente colocar à disposição dos necessitados.
Bem sei que isso na maioria dos casos não acontece mas essa é outra questão, de extrema e abrangente importância, mas paralela à questão do aborto.

Na maioria dos casos a decisão de abortar prende-se com a manutenção do nível de vida ou com preconceitos sociais associados à assumpção de uma gravidez gerada num quadro "socialmente ilegal".
Ambas as naturezas de razão constituem o que de pior se pode esperar da sociedade.

Esta é a verdadeira questão do aborto.
Depois há a questão política.

Aqui é que entram os barcos, os ministros e secretários-de-estado apalhaçados, os primeiros-ministros desconxavados, os presidentes da república com complexos de esquerda e os novos produtos da linha "mar" do Fórum Social - tinhamos o greenpeace (com iniciativas bastante louváveis, por sinal) e agora temos o WoW, em jeito de Barco do Amor em versão sapatona.

Esta questão, apesar de atrair muito mais gente, é completamente vazia de conteúdo, pelo que nem interessa esmioçar o vácuo que vai dentro daquele contentor.
É de tal maneira ridículo que só dá vontade de alugar um barco maior e meter lá dentro todos os que nas últimas semanas opinaram na TV sobre o assunto, deixando-os à deriva no Mar do Norte. (No Atlantico poderiam ter a sorte de dar com os Açores, Madeira ou Canárias e seria uma pena perder a oportunidade de nos livrarmos de tanto lixo mediático).

Façam lá o referendo que tanto querem. Agora ou 2006, tanto faz.
A população não é tão burra e manipulável como fazem crer - quer pelos acérrimos defensores do "Sim", quer pelos beatos e ridículos defensores do "Não".
As associaçõezinhas paternalistas de "defesa da vida", são um gozo pegado e a argumentação é de tal maneira fraca e oca que dá vontade de votar "Não" só para os ver irritados e aos saltinhos a colocar cartazes com fotografias de bebés nórdicos.

A resposta popular ao último referendo foi um rotundo "Não brinquem connosco".
No exame individual, ainda resta um mínimo de consciência à população.
Mas não será certamente por obra e graça dos movimentos pró e contra.
Só resta saber qual a posição das novas gerações.
Estou curioso.

Uma história verídica para rematar o testamento:
Há uns 2-3 anos, num jantar em casa de amigos, encontrei um miúdo dos seus 4 ou 5 anos que mostrava uma inteligência que me surpreendia - tanto ao nível do raciocínio como do relacionamento interpessoal.
No final do serão, já depois dele e dos pais se terem ido embora, o anfitrião comentou que "nem quero pensar que eles pensaram em abortar..."
O anfitrião, homem de esquerda pura e dura, foi um dos amigos do casal que os convenceu a não o fazer aquando da gravidez.
O casal em questão, depois de ter feito o seu planeamento familiar, foi surpreendido com aquela gravidez que vinha complicar os planos de carreira dos pais, bem sucedidas ao nível académico e profissional e sem quaisquer problemas sociais e/ou financeiros.
Hoje em dia, e apesar de também eles serem de esquerda, evitam a todo o custo falar sobre o tema do aborto.
Se ela tivesse abortado, provavelmente eu nunca o saberia e o casal continuaria a ser (aparentemente?) o mesmo.
Como decidiram não abortar, deram-me uma lição de vida.

Contado parece uma lamechice, mas caíu-me como uma bomba depois de ter estado 2 ou 3 horas a brincar com o miúdo.

Anónimo disse...

Desculpa, não posso concordar. Isso vai contra todos os meus interiores, há uma revolução visceral cá dentro. Não é essa a solução, nem pode ser. As coisas não podem ser assim, inconsequentes.

Bis