segunda-feira, setembro 06, 2004

Cruel

Um homem, munido com uma espingarda, de guarda num telhado da escola de Beslan na Ossétia do Norte, vê uma criança semi-nua cheia de sede e de fome a fugir. O homem faz pontaria, arma a espingarda e dispara a bala que de tão potente corta literalmente o corpo da rapariga em dois. È claro que a rapariga não perde logo os sentidos. Com o tronco separado das pernas só morre quando um outro homem lhe atira uma granada para junto da cara. A granada explode e a miúda de seis anos morre.
Qual é a moral disto? "nada justifica a morte de inocentes" ou "o estado russo mata à fome 42 mil crianças na tchétchénia por ano", cada um dirá o que a sua moral exigir. Para mim nenhuma destas hipóteses vai ao osso da questão. O fundo, a essência é que o Homem tem por debaixo da Civilização uma corrente, um desejo profundo de morte. E por vezes, quando a civilização não lhe dá o conforto que acalme o rio subterrâneo e tremendo, esse rio transborda em actos que apesar de hediondos são praticados por homens e portanto humanos. Novidade? Ouçamos as palavras da personagem do assassino da peça Macbeth de Shakespeare:
"- Eu sou o homem, meu suserano, a quem os vis golpes e repulsas do mundo a tal ponto irritaram, que lhe é perfeitamente indiferente praticar qualquer facto que possa ofender a sociedade."
Foi escrito há 500 anos.

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