"ligar, ligar sempre"
Os ditados populares valem mais pela sua solidez sonora que pela sua veracidade intrínseca. Por isso, prefiro os que têm uma "aliteraçãozita", aos que apresentam a "soluçãozona".
Gosto mais do som do ditado "não se misturam alhos com bugalhos" que do conteúdo. Se o som deste ditado tem uma certa harmonia, já o seu conteúdo não só é misterioso como velhíssimo. Misterioso porque 90% das pessoas que o usam não sabe o que é um bugalho, e velho porque para compreender o mundo de hoje é essencial misturar as pequenas plantas bolbosas da família das liliáceas ( os alhos) com as pequenas excrescências que nascem em virtude de picadas de insectos nessa mesma família de plantas (os bugalhos).
Hoje é necessário misturar o conselho de administração da Halliburton com os soldados Americanos no Iraque; é necessário misturar as concelhias do PS e do PSD com as comissões de coordenação; é necessário misturar os assessores dos ministros com os nomes da sua parentela mais próxima.
Hoje, para se conhecer um alho é necessário liga-lo ao bugalho. E é por isto que o ditado é velho: porque não serve para compreender o mundo. Mais: quando alguém impõe que se não misturem os alhos com os bugalhos está, deliberadamente ou por ignorância indesculpável, a impedir que se compreenda o mundo. Numa palavra, está a defender o mundo de ontem: uma realidade em que os fenómenos eram analisados isoladamente.
Hoje, para pensar é necessário misturar. "Ligar, ligar sempre" como escreveu Goethe. Isolar é errar. O especialista é um solipsista e um solipsista é um ignorante acabrunhado, enfezado e de abanos colados aos chavelhos, temendo aterrorizado pelo seu abafador (berlinde grande).
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