segunda-feira, setembro 26, 2005

Utopia ou merda

Um Portugal afundado e triste, mas ainda com uma réstia de esperança, elegeria Manuel Alegre Presidente da República.
Os portugueses votariam em Alegre, não pela sua competência em matérias de economia e finanças nem pela sua simpatia ou experiência do lugar. Votariam em Alegre por nele verem a sua própria revolta, o seu próprio inconformismo com a situação miserável e medíocre a que chegámos. Votariam em Alegre porque a tristeza que traz espelhada na cara, a vontade de desistir e dizer "está bem, eu estou velho e isto já não me interessa nada. Façam lá o que quiserem com a merda do país!", e a vontade ir contra o poder instalado, contra os seus e contra os outros, que dentro dele venceu, seriam iguais às suas vontades. Votariam em Alegre porque saberiam que foi ele o último a tentar parar o mentiroso que é hoje primeiro-ministro de Portugal, eleito com a promessa de não aumentar os impostos. E mostrariam ao PS e a Sócrates que não gostam de mentiras. Votariam no poeta e no utópico que é Manuel Alegre, porque é de poesia e de utopia que nós precisamos. E Alegre ganharia como Soares ganhou em 86, vindo de trás. A meio do que foram os melhores seis ou sete anos de que temos memória. Mas por cá serão os poetas, os artistas e os vendedores de utopias os primeiros a votar em Soares ou em Cavaco. Porque os artistas e os utópicos do burgo vivem dos subsídios do Estado, e não lhes interessa que a utopia passe para as ruas.
Manuel Alegre não mandou o país à merda e, mesmo que já não fosse a tempo de o tirar de lá, ficava bem como Presidente da República. Mas talvez lhe fique melhor, talvez seja mais justo para a sua figura, perder pelas cruzes feitas com as mesmas mãos e canetas que elegerão Valentim Loureiro, Fátima Felgueiras e Ferreira Torres e que antes deles elegeram Durão e Sócrates.
Se eu ainda votasse, se eu ainda acreditasse, votaria em Manuel Alegre. Assim, se passar no sítio onde voto no dia das eleições, votarei num dos outros, à sorte. Tudo para não misturar Alegre com esta merda em que o país se transformou.

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