segunda-feira, setembro 19, 2005

João deão 21



Isabelle dorme de costas para João. O lençol delicadamente abaixo da cintura permite que as sombras rectas das portadas se projectem nas curvas no seu corpo, como se à força de tanta harmonia, as ripas de madeiras duras, feitas sombra pela lua, se contorcessem. João abre os olhos sem acordar e observa Isabelle com se sonhasse. Passa a mão por cima das costas sem lhes tocar. Sente o calor que exala. Feronoma térmica: um calor lento e lânguido como só as mulheres a dormir ao lado de um homem podem emitir. João submerge a mão no lençol, e sente com a ponta do dedo indicador o ângulo do osso da cintura de Isabelle. Depois o contorno do final das costas. Isabelle a dormir sorri. Isabelle a dormir sorri. João aproxima-se, levantando o lençol, que num buraco de vácuo os separa. A sua pele fria contra a pele quente de Isabelle. Desce a mão para o outro lado das costas e avança barriga acima. Percorre com os dedos a pele e tenta definir o milímetro exacto em que o peito se eleva. Tenta. E tenta. Isabelle acorda, olha para a mão de João, agarra-a, e afunda-a perto do coração que bate lento e pesado. Depois inspira e ajeita o rabo contra João. O frio da pele dela, contra o quente do amor dele. Isabelle ajeita-se de um lado para o outro, e afasta ligeiramente as pernas, deixando que João ocupe o preciso triângulo entre o seu sexo e as suas pernas. Como se de mais uma prova de compatibilidade se tratasse, sorriem com a precisão das medidas. Assim, apreciando sem saberem as transformações geométricas das linhas rectas das ripas em linhas curvas do copo, e da ocupação de um espaço triangular por um cilindro, subvertem a física clássica, a lógica matemática e a concordância gramatical. O tempo parou. Mesmo. E durante seis anos toda a terra esteve imóvel. Claro que poucos se aperceberam disso, pois o tempo recomeçou no preciso momento do sorrido de Isabelle dando a 90% da população uma normalíssima sensação de dejá vu.

1 comentário:

Anónimo disse...

Parabéns