quarta-feira, agosto 17, 2005

João Deão 6


Os cabelos molhados pelo suor. O brilho da pele do peito. A linha dos ombros e do pescoço definidíssima e frágil.Tornozelo fino. E, o vestido de menina usado como coisa que protege e que não esconde. Foi nesta que João reparou. Não como o narrador, mas pelas mamas tesinhas e por se ter sentado mesmo à sua frente de perna aberta.
João olha. Ela percebe-o. Num reflexo, compõe-se na cadeira, para logo se voltar a recostar, agora consciente. "O seu prego" disse o empregado. Um homem estranhamente alto, com os braços muito fino e longos, curvado para frente a partir de meio das costas, um queixo projectado e uma pele de doença hepática. Mexe-se abruptamente, sem a fluidez e suavidade que reconhecemos aos mamíferos. Tem os movimentos de um réptil. Angulosos e instantâneos. Para João: era apenas o cabrão do empregado que sempre que podia, confundia uma moeda de 1 euro com uma de dois.
Com um cabrão à sua frente, com um bife a cavalo debaixo dos queixos e com um rapariga lindíssima atrás de si, João percebeu que era altura de sair do balcão. Pegou no prato, colocou os talheres no bolso e levantou-se.
-Vou para aquela mesa, mais outra imperial.
-Psst. Psst. Olhe que não pode mudar. Já pediu, e a conta é feita para o lugar onde está sentado.
-Oh chefe! É para ir ter com as gajas.
-Aquilo não é material para essas unhas.
Mas é. Isabelle tinha reparado em João logo que entrou. Gostou da imagem dele ao balcão, dos dois copos de cerveja vazios e principalmente da camisa de manga curta preta. "Quem usa uma camisa daquelas é capaz de qualquer coisa". 25 anos, nascida perto de Carcassone, filha de viticultores artesanais, vive em Paris. O que Isabelle mais queria era que João entornasse o copo de cerveja que transporta para a mesa por ela abaixo, para ver, se assim, ele perdia o olhar sobranceiro com que a olhou.


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