Anita - dia 178
Agora, que chamo a este sitio casa.
Agora, que quando procuro conforto subo ás gavetas frigorificas que estão mais perto do tecto.
Agora, que passou a ser para sempre. Agora, tenho a verdade para contar os que morreram. Narrar-lhes as historias, responder-lhes às perguntas e sentir-lhes essa profunda desilusão de quem já não é.
O troglodita do bigode deve estar a chegar. AH! temo amigo hoje. Então? até onde iremos meu caro... não tenhas medo e vai onde leva o coração. Avança, assim de peito aberto até onde ardes para chegar.
Um velho e uma velha estão deitados na mesa de dissecação. Unidos. Abraçados. Quando um morreu o outro, companheiro desde a juventude, morreu também. Combinaram assim. E assim se cumpriu. Morreu ela e passados dois minutos de olhar para os olhos a secarem, o outro coração serenou-se de vez. Caiu ao lado dela, abraçou-a, sorriu e morreu. O resto é a história dos telefonemas não atendidos, dos preocupações dos familiares, do arrombamento de uma porta e da descoberta dos dois corpos deitados juntos como sempre na cama.
Pois estas pessoas, garantia de que afinal é possível, jazem cobertas com um lençol branco deitadas no metal frio. Os cabelos dela descem pelo ralo por onde se escoam por vezes líquidos e que uma corrente de água atravessa de vez em quando. As unhas do homem, transparentes e delicadamente longas, viradas para baixo são atravessadas pela luz. À transparência estão límpidas e duras com as unhas dos velhos são límpidas e duras.
O bigode ridículo, que acopla um corpo ainda mais bigode, é mexido e acariciado pelos dedos que se demoraram a entesar o seu mortiço membro viril. Já conheço o procedimento . . . Despe as calças, e sem cuecas dirige-se hipnotizado para o leito final dos velhotes. Exibindo a erecção à ventoinha no tecto, coloca-se ao lado dos égregios avós. Bate violento com o seu pau na testa da mulher. Uma e outra e outra vez. E mais. E mais. E ao lado o companheiro de uma vida nada faz? Após estas pancadas secas, como ele gosta de dizer, um som saiu de dentro da boca da mulher. Os dentes consumidos pela criação de 4 filhos e pelo amor a este homem, e substituídos por uma placa soltara-se. Engasgando-a se fosse viva... Então, colocando-se por cima da mulher penetra-a na boca até ás amígdalas. Delicadamente e aproveitando o degrau natural da sua glande plena de sangue, encaixa-a nos dentes da mulheres retirando-os. A boca da mulher incha um pouco para deixar passar os dentes. Uma tremura e logo se soltariam do encaixe da glande. Mais o homem sabe, costuma fazer isto e a sua precisão é inigualável.
Com os dentes do homem e da mulher nas mãos descansa da sua empresa. Uma gota de suor reflecte a luz quando se solta de ponta do nariz.
Quatro filas de dentes. Duas vidas.
Com as calças na mão, entrega os dentes ao amigo. Este separa-os, divide-os em dois grupos que coloca nas duas extremidades de uma mesa de madeira e põe-os de pé.
Peças de dominó, de damas ou de xadrez? Esta semana é dominó...
1 comentário:
ui... intenso!
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