quarta-feira, abril 28, 2004

AS CLASSES

Para uma discussão sobre a saúde em Portugal convidam-se os médicos, os farmacêuticos e os governantes. Pode ser erro meu, mas quem tem propriedade para falar sobre a saúde em Portugal são os doentes. Digo eu. Só uma pessoa que está internada num hospital, é que sabe se é bem ou mal tratado. Só uma pessoa que utiliza determinado medicamento, sabe se ele funciona ou não. Só uma pessoa que vai a um cento de saúde sabe se é bem atendido e se espera muito. Parece-me lógico. Mas mais lógico parece dizer que também os médicos, os farmacêuticos e os políticos, podem saber como funciona o sistema de saúde, pois, humanos como são, adoecem e também têm de recorrer ao SNS. Formalmente o pensamento está correcto, mas na prática nenhum deles, quando está doente, acede ao SNS como um cidadão normal. Sim, os médicos, os farmacêuticos e os políticos não marcam consultas nos centros de saúde, não vão ao balcão das urgências, nem aviam receitas nas farmácias. Telefonam. Pegam no telemóvel, procuram outros médicos, farmacêuticos e políticos e de imediato recebem os medicamentos em casa, entram nas urgências sem passarem pelo sistema de Manchester que inventaram para os outros ou são atendidos à hora de almoço depois de um "olhe passe por cá por volta da uma que só começo as consultas às duas".
Assim, quem discute o sistema nacional de saúde na verdade não o frequenta. Por isso, apenas por uma questão metodológica deve sempre desconfiar-se de uma mesa redonda para discutir a saúde em Portugal onde não estejam presentes os doentes. Que apesar de tudo, são os mais interessados.