Em defesa da pena de morte
Foi já com os eléctrodos bem ferrados nas pernas, logo após me terem perguntado se queria dizer mais alguma coisa que tudo começou. Começar é uma forma de dizer, já que o meu fim estava, de facto, à distância de uma descarga eléctrica. Mas começava, começava mesmo. Começava a consciência de que ninguém pode levar tanto da vida impunemente. Ninguém pode amar, como eu amei e sair sem arranhadura. Por isso, começava, começava depois da pergunta da última vontade, o sentido que faltou ao tribunal humano, cheio de erros e equívocos, de advogados e juízes. Eu era pobre: estava no sítio errado: fui condenado em três tempos. Mas agora, agora mesmo, no espaço de tempo em que a descarga eléctrica já saiu do interruptor, mas que ainda não me atingiu, agradeço, dou graças, comovido, graças ao Juiz vesgo, ao advogado incompetente e, principalmente à vontade humana de ter culpados. O meu fim, torresmo, é o merecido. Se morresse naturalmente o meu cadáver sublimar-se-ia pela potência do amor que dei e recebi.
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