terça-feira, julho 15, 2003

"levante-se o réu"

"levanta-te tu meu filho da puta"-esta é uma das frases do filme A comédia de Deus de João César Monteiro que é dita por João de Deus a um juiz de direito que encontra o protagonista deitado no banco dos réus. Porque será que ninguém pode estar deitado no banco do réu? A resposta encontra-se numa outra pergunta? o que é um julgamento? um julgamento é antes de tudo um ritual de degradação pública para o arguido. Este é obrigado a estar de pé enquanto lhe é lida a acusação enquanto todos as outras pessoas na sala estão sentadas, o arguido fala de frente para um juiz que para além de estar escudado por um traje negro, barrica-se por detrás de uma enorme secretária posta a um nível superior do resto da sala. Se o ritual judiciário reserva ao arguido este papel pouco digno, às testemunhas está reservado o papel de criança. Na verdade, toda o modo encenado para fazer entrar uma testemunha dentro de uma sala de audiência serve para a infantilizar. A testemunha porque na maioria das vezes nunca foi a nenhum julgamento, vai à medida que entra, perguntando ao juiz ou ao funcionário onde deve sentar e por onde deve entrar. A todas as testemunhas que entram pela primeira vez numa sala de audiência o sistema reservou o papel de crianças perdidas num labirinto a pedir indicações ao minotauro.
Hoje acaba o ano judicial. Muitos vão apelar a reformas para tornar a justiça mais justa. Pois sim, enquanto a matriz foi aquela que descrevi não é suposto que haja justiça mais justa. Por isso, a melhor resposta ao imperativo: levante-se o arguido. Deve ser....

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