terça-feira, outubro 17, 2006

Desalentos de cidadania - parte II

Tudo o que não evolui, morre! Desde que foi adaptada como forma de governo, a democracia foi evoluindo para um sistema que quase se contradiz nos seus próprios princípios. Por exemplo, a liberdade de expressão que a caracteriza, não se aplica a si própria. Qualquer um que, levianamente, levante a voz contra alguns dos problemas da democracia (ocidental no seu conjunto, ou Portuguesa no particular), dada a nossa ainda recente transição de regime, é, automaticamente, rotulado de fascista! Qualquer um que critique a actual constituição ou tente identificar a verdadeira causa do desinteresse dos eleitores (que actualmente atingiu o limite do ridículo de nem metade dos cidadãos se interessar o suficiente para eleger os seus representantes) é anti democrata!

O lobby, na sua definição, seria a aplicação de um princípio democrático, em que muitos indivíduos se aglutinam em torno de um objectivo comum, aumentando a sua voz e capacidade de influência. No entanto, nenhum lobby deveria ter a capacidade de tornar toda a restante população refém dos seus interesses, excepto se reflectisse a vontade da maioria dos cidadãos, altura em que se constituiria em governo pelos caminhos apropriados. Atente-se ao que se observa em Portugal: os lobbys farmacêutico e médico (ainda não considerando o dos seguros ? a seu tempo) conseguiu destruir o direito básico do acesso à saúde! No entanto, ao averiguarmos responsabilidades, a culpa morre solteira? O lobby dos professores, formadores e educadores, e das escolas e universidades, conseguiu destruir o direito básico do acesso à educação! No entanto, ao averiguarmos responsabilidades, a culpa morre solteira? O lobby da construção civil, do cimento e das imobiliárias, conseguiu destruir o direito básico do acesso à habitação! No entanto, ao averiguarmos responsabilidades, a culpa morre solteira?

Mas as falhas do sistema não se esgotam nos interesses organizados. A inércia e a falta de interesse e participação dos indivíduos acarretam também alguns malefícios! Veja-se o caso do ambiente. Os sinais de catástrofe iminente sucedem-se. Buraco na camada de ozono, aumento da frequência de tempestades e tornados, situações de clima extremo (secas, chuvas, frio, calor, etc.), efeito de estufa, desaparecimento das calotas polares, subida do nível das águas do mar, entre outras situações que podemos já experimentar em qualquer país do mundo, chamam-nos a atenção para as alterações que já provocámos no meio ambiente. Não se trata já de apenas um artigo científico, de um qualquer cientista excêntrico, sem nada melhor para fazer. É a nossa casa, a nossa subsistência, o nosso estilo de vida (e mais importante, os das gerações que se seguem), que se encontra em risco. A desertificação dos terrenos, a destruição da floresta tropical, a contaminação das águas potáveis, o abuso de antibióticos, as descargas poluentes para o ar, água e solo, tudo isto é resultado de incúria e desinteresse do indivíduo. Alguns dizem que nada podem fazer, ou por falta de dinheiro ou por falta de espaço ou por comodismo. Mentira! O impacte do que cada um pode fazer é, de facto, não mensurável mas o somatório da inércia é avassalador nos seus efeitos nefastos!

Veja-se também o caso da corrupção ou do abuso dos bens públicos. Todos conhecemos ou ouvimos falar de casos em que alguém conseguiu algo por vias travessas. A expressão da indignação foi substituída por uma admiração invejosa do género ?ele é que sabe! Eu fazia o mesmo no lugar dele se pudesse!?. As Fátimas Felgueiras, os Valentins Loureiros e outros, que foram (e estão a ser) alvo de processos na justiça, ao invés de se esconderem envergonhados pela culpa, sobem ao púlpito para, bem alto e indignados, clamarem inocência, escudados num qualquer erro processual (carimbo errado, falta de assinatura ou coisa assim), que anulou o processo mas não a verdade dos factos! E o povo admira-os, cego pelo brilho dos holofotes das câmaras, iludido pela grandiloquência dos discursos.

Como se não bastasse, aqueles de entre nós que são eleitos para desempenharem cargos de liderança públicos, guiarem os nossos destinos e gerirem a riqueza comum, são, cada vez mais, os menos adequados para tal. O descrédito gerado por anos, décadas de escândalos, má gestão, roubo e corrupção deixou uma marca suja que nenhuma pessoa de bem quer ver associado ao seu nome. Ainda assim, deveria haver coragem nos que nascem líderes e com capacidades acima da média para, pelo bem de todos, resgatar o comando das instituições públicas e restaurar a confiança na democracia (ou noutra qualquer forma superior de governação).

(continua)

1 comentário:

Anónimo disse...

E se não for a democracia que solução Actual seria desejável?