sexta-feira, julho 14, 2006

choque

O choque de civilizações nem está nas diferenças religiosas, nem nos diferentes estados de desenvolvimento. Não está na incorporação democrática nem na defesa do capitalismo. O choque de civilizações está na pastelaria do bairro. O choque de civilizações acontece geralmente pelas sete e meia da manhã quando um homem de 34 anos, vermelhíssimo do sol, bebedíssimo da cerveja e excitadíssimo por duas mulheres, uma acobreada e outra aloirada, também bêbadas, vermelhas e excitadas, troca um olhar com um homem de 36 anos, magro, esquálido e triste. O choque de civilizações acontece porque os três que fumam, emborcam cervejas e fixam os olhares uns nos outros, transmitem um ritmo que o homem recém acordado não reconhece e estranha porque lhe é exterior. E mesmo que estivesse disposto a compreender os três que enchem a pastelaria de fumo e de hálito de bêbado, teria que se embriagar, mas como entra às oito menos um quarto não pode. O choque de civilizações nada tem que ver com a religião, nem com o desenvolvimento económico, democracia, ou capitalismo. O choque de civilizações tem que ver com o tempo e por isso com os ritmos que se produzem.