quinta-feira, maio 12, 2005

Uma manhã portuguesa, com certeza

Chego à empresa e não tenho internet. Já não tinha quando saí ontem. A empresa para que trabalho arrenda instalações a outra empresa, a quem pertence a casa, a rede informática e a ligação à internet. Como medida de redução de custos, a empresa dona da casa despediu a sua única funcionária e não tem ninguém a trabalhar que possa resolver o problema.
Pego no telefone e, como já conheço os serviços de apoio a clientes da Netcabo, não ligo para lá. Ligo para o informático da empresa, que assegura que só a Netcabo me pode ajudar: o problema é deles.
Pego na factura da Netcabo e ligo para o número de apoio a clientes que aparece no rosto da factura. Atende-me uma menina que me diz, imediatamente, que a Netcabo tem o sistema informático avariado e que, não podendo confirmar se sou cliente ou não, a Netcabo se recusa a ajudar-me. Pergunto o nome à menina e peço para falar com o superior hierárquico. Aparece-me outra menina que me diz, sem grande educação, que liguei para o número errado e que, por isso, a discussão não tem sentido: esqueço-me sempre que, no verso da factura da TV Cabo, no fundo da página, em letras não muito grandes, se indica que o apoio a clientes Netcabo é feito por outro número. Agradeço, sem preocupação de ser educado.
Ligo o novo número. Nova menina. Afinal há sistema informático. Dou o número de cliente. Nada feito. Sou cliente empresarial. Através daquela linha não me podem ajudar. Tenho que ligar outro número. Este nem vem na factura que vem para a empresa. Irrito-me, grito, esperneio, chamo-lhe incompetente e apetece-me chamar-lhe coisas piores. Não peço para falar com ninguém, não pergunto o número dos clientes empresariais. Grito "IMCOMPETENTES, IMCOMPETENTES, INCOMPETENTES!!! VOCÊS SÃO TODOS UNS INCOMPETENTES!" e desligo-lhe o telefone na cara.

São 11 da manhã. Ainda não tenho internet. Desligo o cable modem, desligo o router, volto a ligar tudo. Desligo tudo, desligo o computador e volto a ligar. Por todas as ordens possíveis. Verifico se os cabos estão bem ligados. Não sei o que fazer. Às onze e meia, como por milagre, a terceira luz do cable modem acende. Se um qualquer técnico da TV Cabo quisesse ter confiado que eu sou cliente, o meu dia teria mais duas horas.

A irritação passou com o fim do telefonema. Já com internet penso que a culpa não é da Kátia Alves, nem da Josefina Ladeira nem da Sandra Silvestre. Se eu ganhasse o salário mínimo e soubesse que me iriam dispensar no fim do contrato para contratarem outra, de maneira a nunca terem funcionários com vínculo definitivo, preocupava-me com os clientes da minha empresa? Claro que não! Se a Kátia, a Josefina e a Sandra fossem bem tratadas pela sua empresa, se os patrões delas soubessem como é viver com um salário mínimo em Portugal, se tivessem nascido num país civilizado, se os pais não lhes tivessem chamado Kátia e Josefina... tantos ses que podiam ter melhorado a vida delas e o meu dia. Mas a culpa não é delas. A culpa não é dos donos da ligação à internet que despediram a pessoa que tratava do assunto para reduzir custos, mas mantêm a empresa aberta sem ninguém a trabalhar nela. A culpa é minha, que ainda me chateio, que não faço como elas... O que é que me interessa a mim? Por que é que eu me chateio?

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