segunda-feira, abril 04, 2005

1997

19:21 Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens, dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu; e vem e segue-me.
19:22 E o jovem, ouvindo essa palavra, retirou-se triste, porque possuía muitas propriedades.
19:23 Disse, então, Jesus aos seus discípulos: Em verdade vos digo que é difícil entrar um rico no Reino dos céus.
19:24 E outra vez vos digo que é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no Reino de Deus.

Mateus 19

Católico por herança familiar, como a maioria dos portugueses. Baptizado e primeira comunhão. Assim era eu. Mas dez anos de colégios de freiras e jesuítas conseguiram afastar-me progressivamente da Igreja Católica. A pouco e pouco as coisas que ouvia na missa e o próprio ritual começaram a incomodar-me.
Mais tarde chegou a consciência dos lobbies, das caixas de esmolas, da Universidade Católica a arranjar empregos para os seus meninos.
A machadada definitiva na minha ligação à Igreja Católica chegou em 1997. Numa estadia em Itália comecei a coleccionar folhetos distribuídos nas Igrejas com o apelo "Ajude os padres católicos" (trouxe um que guardo "religiosamente" para que nunca ninguém me diga que a história é inventada). Lá se dava conta dos benefícios fiscais resultantes de doações ao Vaticano. Num dia de Novembro fui a Roma e ao Vaticano. Na Praça de São Pedro havia milhares e milhares de cadeiras preparadas para a missa do dia seguinte. Os turistas cansados de quilómetros a andar só podiam sentar-se no chão. Foi aí que nos sentámos, uns minutos, antes de entrar na Basílica. Lá dentro não demos pelo tempo a passar. É magnífica, a Basílica. Quando saímos tinha passado mais de uma hora. Uma hora de mármore, madeira e ouro. Uma capela inteira forrada a ouro. Ouro, ouro e mais ouro. E mármore. E mais ouro.
Nesse dia já era tarde para visitar o museu do Vaticano. Não voltei a Roma para visitar o Museu. Não voltei a Roma para ver o Papa. Acho que não quero ver o Museu. Dizem-me que é ainda pior.
O Papa morreu. O Papa que me parecia um bom homem. Que olhava de frente e parecia sincero. Que era carismático. Mas o Papa que estava à frente desta Igreja Católica. Que era o guardião de todo o ouro.
Tenho a convicção de que a História, daqui a muitos anos, julgará com cinismo esta Igreja rica que assiste à morte de milhões de pessoas à fome pelo mundo, que pede esmolas aos pobres para dar empregos, favores e poder aos ricos. A mesma História não se esquecerá daqueles que dentro da Igreja Católica dedicaram a sua vida aos "mais pobres dos pobres". Não com palavras, nem com lobbying, nem com segundas intenções. Com actos.
E Deus? O Deus de que fala a Igreja Católica, de quem supostamente João Paulo II era o representante na Terra, o que achará desta Igreja das esmolas e dos favores, dos empregos e dos lobbies, do ouro, dos templos, dos santos idolatrados e dos benefícios fiscais?
Se esse Deus existe, imagino que esteja agora a ter uma longa conversa com Karol Wojtyla sobre todas estas coisas. Se Ele existe, como eu gostava de saber o que pensa sobre isto...

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