Suspeito que, lá como cá, até depois de casados os meninos continuam a viver à custa da família...
A ITÁLIA DOS "MAMMA BOYS"
Vivem em casa dos pais, não ganham mais de mil euros e mesmo quando ganham não arriscam. Não contam nem na demografia nem na campanha eleitoral.
O que faz de Roma uma das capitais mais visitadas do mundo é o mesmo que impediu sempre o metropolitano da cidade de se desenvolver. "Obras de arte por todo o lado, sim, é verdade. É no meio disto que se vive em Roma", diz Fabrizio Turchetti. Mas este romano de 27 anos abdicaria amanhã da casa dos seus pais onde vive e trocaria um quotidiano feito no centro de todos os tesouros por uma casa nos subúrbios: "E nem precisava de ter carro, nunca faria um empréstimo para comprar um carro novo, bastava que o metro me levasse mais ou menos rapidamente da casa ao trabalho."
A verdade é que a Fabrizio Turchetti não falta só o metro. Precisava antes de um emprego ao qual correspondesse um salário real. "Com isso começava a fazer as malas."
Nem todos os italianos pensam assim. Na Itália de hoje, com uma das maiores esperanças de vida do mundo, idêntica à da Suécia e do Japão, e mais de metade da população acima dos 40 anos, os jovens saem cada vez mais tarde de casa. Têm menos filhos e têm-nos mais tarde, muito mais tarde. Fabrizio diz que isto acontece em parte "porque os italianos não querem deixar a boa vida".
Geração Mil Euros é o título de um livro assinado por dois jovens de Milão, alguns anos mais velhos do que Fabrizio. Foi disponibilizado há alguns meses na Internet e mais de 24 mil downloads depois os direitos foram vendidos para o cinema. Claudio, o protagonista, é inspirado na vida dos dois autores, Alessandro Rimassa e Antonio Incorvaia, 31 anos e muitos empregos no currículo. Mil euros de salário.
"Se ganhasse mil euros, casava"
Segundo um estudo publicado este ano, 89,2 por cento dos italianos entre os 17 e os 24 anos ganham menos do que isso. No grupo etário de Rimassa e Incorvaia, dos 25 aos 32, são cerca de 65 por cento os que não chegam a este valor. Cláudio, o herói dos jovens jornalistas de Milão, tem 27 anos e não deixa de viajar, jantar fora ou comprar roupa. O que não fez foi sair de casa. "Se ganhasse mil euros casava amanhã!" E pronto. "Para a casa sim, faria um empréstimo", garante Fabrizio. Não o faz porque depois de uma licenciatura em Economia na Universidade de Roma e de um mestrado em Buenos Aires ainda só conseguiu um contrato de seis meses numa consultora internacional que trabalha com empresas com projectos no Terceiro Mundo. Para além de ganhar 300 euros e não mil, com o tipo de contrato que tem não consegue um empréstimo. "O problema, mais do que social ou económico, é existencial. Penso que há uma precariedade existencial na geração com cerca de 30 anos, e isso deve-se principalmente a uma ausência de comunicação entre gerações", defende Mario Adinolfi. Aos 34 anos, Adinolfi considera-se muito ocupado: autor de um dos blogues mais lidos do país, tem um programa de rádio, assinou já vários livros sobre a juventude ou temas políticos. No blogue e na rádio tenta tratar o que considera ser "o mais grave problema de hoje em Itália". Por um lado, jovens numa situação mais precária que a francesa - "é interessante olhar para França, adultos que fazem uma lei para mudar a vida dos jovens sem falarem com eles, a diferença é que em Itália não se reage". Por outro, "uma sociedade completamente fechada em todas as áreas importantes" - os media, o ensino, as empresas. "É verdade que a economia está estagnada, mas isso é assim porque não se faz pesquisa, não se inova, não há cérebros jovens nas empresas."
"Preguiça instalada"
Nesta campanha eleitoral, os "mammones" ou "mamma boys" contam pouco. Quando Silvio Berlusconi propõe aumentar as pensões ou abolir o imposto sobre a propriedade para quem já possui casa, não é neles que está a pensar. "Os políticos que temos não falam para nós, falam na nossa situação como um problema, mas na realidade não querem saber", lamenta Adinolfi. Fabrizio Turchetti sublinha a "falta de coerência" no discurso dominante dos que têm a sua idade ou um pouco mais. "Todos dizem que têm problemas, lamentam não poder casar, fazer planos, pensar em ter filhos. Mas quando finalmente saem de perto dos pais é porque têm à espera casas com tudo", resume. "Mas tudo! Móveis caros, electrodomésticos, nada para construir, já tudo pronto." Para Adinolfi, que saiu de casa aos 20 anos e já esteve dez anos com contrato a termo, também "há uma responsabilidade que é nossa, dos jovens". "Uma parte está muito cómoda, é preciso perceber isso. Estão integrados no seu sistema familiar, são mantidos pelos pais e não vão à procura da sua vida. Temos uma geração
acomodada e sem vontade para fazer nada. Há uma preguiça instalada a que chamaria mesmo um complexo de depressão."
Texto do Público de hoje